quarta-feira, 31 de março de 2010

Prêmio Nobel da Paz para economista do Bangladesh, economista!?

O economista Muhammad Yunus ganhou, em 2006, o prêmio de maior reconhecimento da humanidade, o Nobel da Paz. Outras figuras lendárias como Martin Luther King Jr.,Nelson Mandela e Madre Teresa de Calcutá também tiveram a honraria de ser considerado o ser humano que mais contribuiu para a paz mundial. Mas, porque um economista ganhou esse prêmio?
"A paz duradoura não pode ser obtida sem abrir
um caminho para que uma ampla parte da
população saia da pobreza"
Comitê Norueguês do Nobel - 2006
Muhammad Yunus a partir de uma idéia simples pode mudar a vida de milhares de pessoas de um país miserável, ele é fundador de um Banco cujos clientes recebem crédito facilitado com juros baixo, chamado de microcrédito, para financiarem projetos que propiciam retorno financeiro aos próprios clientes. Como é possível atitudes como a apresentada acima, contrária à lógica do sistema financeiro, que preza por juros alto e ganhos astronômicos, garantir a paz em determinada região e ser merecedora do Nobel da Paz. Melhor ainda, como é possível relacionar Economia, Direito e Paz.

Por toda a história da humanidade a economia foi impulsionadora de diversos conflitos entre os homens. Independentemente do modelo econômico adotado, mercantilismo, imperialismo, socialismo e por fim o capitalismo, sempre houve e sempre haverá conflitos nas relações humanas no campo econômico.

Conflito, aqui, não deve ser entendido apenas como guerra entre países, clãs, entre grandes corporações econômicas e etc, mas, principalmente como embates desenvolvidos no seio da sociedade de determinado país. Por ora, vale ressaltar e exemplificar que os maiores conflitos existentes na sociedade são causados pela marginalização de determinados grupos ao acesso dos bens e produtos produzidos pela própria sociedade, é fácil ilustrar essa propositura, no Brasil temos claros exemplos desses conflitos, como o Movimento dos Sem Terras e o Movimento dos Sem Teto, grupos organizados representativos dos indivíduos que não tem acesso a Terra e à moradia, respectivamente. Outros conflitos, contudo mais velado, permeia nossa vida, nosso cotidiano, são protagonizados pelos cidadãos subjugados e amontoados em suas casas nas favelas, pela classe desempregada, e pelos miseráveis invólucros pela pobreza.

Todos esses atores têm algo em comum a privação ao acesso a determinado bem ou serviço produzido na economia, alguns mais outros menos. O fato é que para uma economia de mercado, como a observada no Brasil, pouco importa quem está consumindo os bens e produtos produzidos pela sociedade, o importante é que esses bens sejam consumidos por alguém, para que assim a “roda da economia” possa girar.

Esse é o raciocínio por detrás da teoria de Ótimo de Pareto, que, em poucas palavras, define como condição para haver equilíbrio econômico em determinada economia de mercado apenas que as trocas entre os agentes da economia não pioraram a situação dos outros, desse modo, pouco importa se determinado agente possua todos os bens da economia e os demais nenhum. Ora essa situação também não é muito difícil de exemplificar, basta lembrar que nosso Coeficiente de Gini é um dos maiores do mundo, mas, ainda assim, nós nos transacionamos de modo satisfatório no ramo econômico.

Dito como em uma economia de mercado pode gerar discrepâncias astronômicas no acesso aos produtos gerados pela sociedade e, por assim dizer, gerar conflitos deflagrados e outros ocultos pela luta desses recursos, resta-nos saber como o Direito pode alterar as regras do jogo econômico, amenizar os efeitos da economia de mercado e com isso diminuir os conflitos sociais acima apontados, garantido assim a paz.

Primeiramente, vale ressaltar, à luz dos relevantes ensinamentos do professor Doutor Rosemiro Pereira, que “o Direito não está a serviço da economia, mas a economia está a serviço do Direito”. Embora esse tema seja ainda muito polêmico, ajuda-nos a vislumbrar a capacidade inerente ao Direito para garantir paz social por meio da regulação da atividade econômica.

O Direito como conjunto de regras e princípios programáticos e impositivos tem como possibilidade garantir às pessoas menos abastadas acesso a bens e serviços que sem normas que viabilizassem esse acesso não seria possível garanti-lo.

Por exemplo, acesso à saúde, entendida em sentido mais estrito, como serviço prestados por profissionais e produtos como remédio e etc, em uma economia voltada para o mercado como a americana, o acesso à saúde não é universal, pelo contrário, é um produto caro para os cidadãos americanos, bem como a educação o é também.

É claro que não devemos ser ingênuos em pensar que por essa característica a sociedade americana vive em conflito, lutando por acesso à saúde - sem paz - isso porque, apesar desses dois exemplos acima serem produtos caros e um bem exclusivo, causador de certa marginalização em qualquer sociedade, os americanos tem condições suficientemente boas para pagar por esse produto, o que reflete o modelo econômico pretendido por aquele país, ou seja, um Estado Liberal.

Porém, se aqui no Brasil o regime de saúde e educacional fosse inspirado no americano, tenho certeza que não presenciaríamos a mesma paz social observada no primo rico.

Com esse exemplo, é possível delinear como o direito pode redefinir a distribuição dos produtos produzidos pela sociedade, e com isso, diminuir a marginalização dos indivíduos. Através de princípios e normas, o Direito impõe ao Estado e aos agentes econômicos condutas capazes de diminuir as disparidades provocadas pelo regime econômico adotado pela sociedade moderna e com isso reduz os conflitos sociais.

Além do caso de acesso à saúde e educação - que no Brasil são constitucionalmente universais e gratuitos, dentro de suas limitações, é claro! - podemos suscitar outras imposições das normas e princípios do Direito, no caso brasileiro, que altera as regras do jogo econômico, modificando uma economia de mercado, tornando-a menos excludente e mais includente. São elas: salário mínimo, imposto regressivo, moradia, reforma agrária, entre outras atuações que, sem a participação efetiva do Estado, imposta pela norma, não surgiria naturalmente do contexto econômico.

A economia em função do Direito é capaz de ser moldada a favor de uma situação na qual os indivíduos que compõem a sociedade possam gozar do acesso aos bens e produtos da economia e de oportunidades nas quais possam viver em condições melhores e, satisfeito suas necessidades (diminuído a pobreza), em paz.

Voltando ao caso do nosso amigo Muhammad Yunus, são notáveis as boas intenções desse banqueiro, mulçumano, nascido em Bangladesh, contudo, atitudes como essas não brotam espontaneamente em qualquer contexto econômico, principalmente tratando-se do modelo capitalista, ainda mais quando taxada como missão impossível pela comunidade financeira. Porém, não fosse essa idéia simples milhares de pessoas nesse pequeno país estariam em estado de miséria, e como afirmado no veredicto do Comitê do Prêmio Nobel para entrega do prêmio, “A paz duradoura não pode ser obtida sem abrir um caminho para que uma ampla parte da população saia da pobreza".

Agora, se tem algo que é factível ao campo de atuação do Direito e, de certa forma, a propria essência do Direito, é induzir comportamento desejáveis socialmente. E, na seara econômica ainda há muitas boas atitudes a serem induzidas pelas normas e princípios do Direito para diminuir a pobreza - entendida como privação ao acesso a bens e produtor - e garantir a tão almejada PAZ SOCIAL. Assim sendo, há de fato uma relação muito forte entre Economia, Direito e Paz, contudo, não nessa ordem intuitiva, mas sim, Direito, Economia e Paz.

Leandro Pereira

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